quinta-feira, 7 de maio de 2015
segunda-feira, 4 de maio de 2015
"Winter Sleep": A Máscara do Cavalo Selvagem
Os amantes dos pensamentos altruístas, de lições éticas e de textos exemplares de boa conduta, questionadores do estabelecido, críticos da vanguarda, irônicos sinceros e toda classe de filósofos das mídias sociais reservem três horas e 15 minutos e baixem no cinema para ver de perto #WinterSleep. O filme do turco Nuri Bilge #Ceylan e seus diálogos longos e imagens congelantes são reveladores. Puxam fio a fio a nuvem que cobre Aydin, homem dono de imóveis e de hotel na região de Anatólia. O ex-ator é também colunista de um jornal regional, espaço onde digita regras que imagina cumprir naquele frio vilarejo. O personagem teatral vive do discurso estruturado que o engana e anula o outro. Sufoca como o laço que amansa o cavalo selvagem em cena exemplar (a da foto). Uma sequência de muitos minutos (20?) resume o filme: Aydin, iluminado pela tela branca e tecnológica de um Mac, tem a máscara exposta por palavras de lamina fina da irmã repousada ao fundo no sofá sob a luz amarela do abajur. Não é diversão e nem peça filmada. É cinema e dos ótimos!
terça-feira, 21 de janeiro de 2014
Dois Estranhos Fora da Bolha de Plástico
A cegueira, a fantasia, o medo e o desespero de quem é forçado a deixar a bolha que habita estão em dois filmes em cartaz no Rio: "Blue Jasmine" e "Um Estranho no Lago".
A obra de Woody Allen compacta esses sintomas na elegante decadência de uma novíssima e filantrópica alta burguesa em Nova York. O longa de Alain Guiraudie centra a lente em um jovem cujo destino é o desejo sem censura ética.
O diretor americano se cerca da moral da periferia para pinçar do aquário a personagem interpretada por Cate Blanchett e deixá-la sem oxigênio e sem champanhe. O francês aluga a amoral do sexo explícito para afogar o jovem apaixonado vivido com naturalidade por Pierre Deladonchamps.
A diferença fundamental entre os dois é a direção sinalizada pelo roteiro: “Blue” arrasta o peixinho para fora do lago dos milionários e “O Estranho” traz o real e a razão para dentro do paraíso sem pecado.
O traço de união das duas obras é o choque que provocam não nos personagens reféns de um mundinho particular. Os dois filmes atingem sim a plateia incapaz de salvá-los de fins particularmente redentores.
Allen desidratar a estrela homeopaticamente com humor seco e poças rasas de esperança. Guiraudie injeta prazer pelos poros até cegar a vítima.
Sobra muito pouco de sanidade para os seres das bolhas de plásticos. Nós, que gostamos de bom cinema, ficamos agradecidos pela originalidade de duas histórias tão descombinadas e próximas na qualidade de revelar traços da sociedade contemporânea e artificial de nossos tempos virtuais.
A obra de Woody Allen compacta esses sintomas na elegante decadência de uma novíssima e filantrópica alta burguesa em Nova York. O longa de Alain Guiraudie centra a lente em um jovem cujo destino é o desejo sem censura ética.
O diretor americano se cerca da moral da periferia para pinçar do aquário a personagem interpretada por Cate Blanchett e deixá-la sem oxigênio e sem champanhe. O francês aluga a amoral do sexo explícito para afogar o jovem apaixonado vivido com naturalidade por Pierre Deladonchamps.
A diferença fundamental entre os dois é a direção sinalizada pelo roteiro: “Blue” arrasta o peixinho para fora do lago dos milionários e “O Estranho” traz o real e a razão para dentro do paraíso sem pecado.
O traço de união das duas obras é o choque que provocam não nos personagens reféns de um mundinho particular. Os dois filmes atingem sim a plateia incapaz de salvá-los de fins particularmente redentores.
Allen desidratar a estrela homeopaticamente com humor seco e poças rasas de esperança. Guiraudie injeta prazer pelos poros até cegar a vítima.
Sobra muito pouco de sanidade para os seres das bolhas de plásticos. Nós, que gostamos de bom cinema, ficamos agradecidos pela originalidade de duas histórias tão descombinadas e próximas na qualidade de revelar traços da sociedade contemporânea e artificial de nossos tempos virtuais.
segunda-feira, 13 de maio de 2013
A Esperança do Patinho Bobo da Corte
“Reality – A Grande Ilusão” está distante de ser um filme-tese sobre a busca cega pela fama. O longa-metragem de Matteo Garrone, vencedor do Grande Prêmio do Júri de Cannes 2012, faz um tratado nada otimista da esperança. É a história de Luciano (Aniello Arena), um simples comerciante e insignificante fraudador, que troca o viver pelo esperar. Se deteriora socialmente e emocionalmente como um religioso com fé de remover montanhas imaginárias.
O diretor dá a ré, acelera e passa por cima do tema “realidade e representação”, já desgastado pela enxurrada de BBBs e similares, combatidos e festejados por grupos que estão nos extremos da pirâmide pensante. O Big Brother Itália é apenas uma apropriação de um objeto que anima plateias nos bares da intelectualidade. Poderia trocá-lo por qualquer símbolo de sucesso e poder desejados por muitos: de “ganhar na loteria” a “receber a garantia divina do Céu eterno”.
O roteiro reúne em cena os habitantes típicos do bico da bota europeia. E desnuda o universo simpático e cafona que ronda a classe média periférica das nações emergentes, das ricas e das decadentes do planeta global. Gente humilde, escandalosa e com sede de um algo mais que o consumismo e a diversão efêmeros não podem oferecer. Querem beber na fonte do extraordinário e sair definitivamente da inércia provocada pela rotina.
O bobo desta corte é justamente o peixeiro Luciano. Jogado na cova das serpentes célebres, o patinho tolo será digerido e cuspido. Um processo doloroso que a vítima não sente. A anestesia do astro de “Reality” é a tal da esperança, produto vendido nas igrejas, nos comícios, nos livros de autoajuda e naquele papo amigo regado a chope de sexta-feira à noite.
Quem está em torno do anti-herói sofre, sorri e lucra, dependendo do grau de parentesco e de amizade. O público também. Sorri no início, sofre com a degradação do personagem e lucra com um filme inteligente, com um fim irônico e doloroso.
domingo, 28 de abril de 2013
"Abismo Prateado": O Silêncio Estridente do Abandono
"Abismo Prateado" trata do som estridente e do silêncio profundo da rejeição.Mostra que o efeito do fim de uma relação sobre o outro tem a força de uma onda despencando na impávida e imóvel areia. O filme de KarimAïnouz assim é uma ópera ensurdecedora que serve de introdução à canção de Chico Buarque inspiradora da obra cinematográfica.
No centro do drama, Violeta canta uma ária dissonante. É uma soprano sem palco e plateia. A queda da personagem central é visceral (real e metafórica). A mulher desaba diante do abandono covarde e mudo do Amor e segue de perto a letra de “Olho nos olhos”. Quase enlouquece.
O abismo desenhando por Aïnouz parece não ter chão. Longe de se deixar levar pela tentação da interpretação literal da letra de Chico, o roteiro aprofunda a dor e oferece uma cicatrização natural e surpreendente como a simplicidade da vida. Convoca outros seres à beira do abismo para iluminar o caminho de volta.
Este pequeno filme é grande pela segurança que o diretor conduz cenas com poucos diálogos e as une; e o desempenho de Alessandra Negrini. Uma história sem explicações fáceis, justificativas lógicas e psicologismo de folhetim exigiu tanto de Aïnouz quanto da atriz um esforço extra para criar uma obra digna da original.
No fim da (minha) sessão, parte do publico reclama da falta de um fechamento dramático, de um (re)encontro salvador e de uma definição mais clara dos destinos. Reclamam como se não soubessem que, na vida Real e talvez na letra de Chico, o abandono e a rejeição deixam marcas que nem uma melodia (e muito menos um filme) é capaz de curar.
domingo, 6 de janeiro de 2013
Uma Negociação com Til Maiúsculo
O cinemão
é um aumentativo. É para quem não é um bom entendedor e precisa de muito mais
do que uma palavra completa. Duas não. Incontáveis palavras e imagens claras e
frases e cenas objetivas. O clichê é apenas uma consequência que se tornou uma
marca do estilo industrial de fazer cinema com “a, o, til”. Raramente é
evitado por completo. Obra mediana, como “A Negociação” ("Arbitrage"), se serve dele
acompanhado de dois e três toques de originalidade
Aqui é um
par. Duas boas ideias amenizam o “ão” do filme de Nicholas
Jarecki: a dor (anti)ética e real do protagonista e a (quase) ética da minoria
racial e social americana encarnada por um jovem do Harlem. São bases fracas
que sustentam o roteiro. Sem elas, a história singraria pelo caminho do lugar
comum.
“A
negociação” traz aquele empresário sexagenário charmoso Robert Miller (Richard
Gere) à beira do abismo e da falência que precisa vencer o tempo e fechar a
venda salvadora de sua empresa financeira a um grupo capitalizado. Entre a cama
da esposa contemporânea (Susan Sarandon) e a da jovem amante artista plástica
(Laetitia Casta), vai desenhando o golpe perfeito. Um acidente de carro com
morte muda a direção e dá a partida para um jogo de ratos e ratos.
O ritmo é
o mesmo de outros filmes da categoria thriller-capitalismo-selvagem. E ágil
para não cansar. O elenco principal completa a estética da direção veloz com
atuações técnicas e satisfatórias. Há até uma pequena virada no final para
autenticar o estilo fast-film.
As tais
duas ideias são menos originais que eficientes para a narrativa. As dores
internas provocadas pelo acidente vai marcar Miller e o desempenho de Gere
durante 80% do tempo. O filme grita que o nosso anti-herói de cabelos brancos
sente, em silêncio, a hemorragia moral.
Jimmy
Grant (Nate Park) o rapaz negro leal é uma ponta de sofisticação e de
ambiguidade de “A Negociação”. Aceita ser peça de manipulação em
respeito aos valores americanos. Sejam eles quais forem: moeda, honra...
A moral Grant e
as dores de Miller são o til maiúsculo desse cinemão americano esquecível.
quarta-feira, 28 de março de 2012
O Irã é em Laranjeiras, na Vila Madalena, em NY...
Teresinha de Maomé. De uma
queda, foi ao chão. Acudiram três cavaleiros. Todos os três com o Alcorão na
mão. O primeiro foi seu marido. O segundo foi seu patrão. O terceiro foi aquele
idoso que a Teresa deu a mão. “A Separação”, o filme iraniano da vez (Oscar,
Globo de Ouro, Ursos em Berlin etc) é uma ciranda amoral. Um jogo de empurra de
homens e mulheres no limite da existência (física, psíquica ou financeira). Sem
véus, duas famílias de classes distintas entram em colisão numa história movida
por inverdades e meias-mentiras.
É quase redundante
dizer que o elenco é refinado e passa longe do exagero ou do falso brilho das
interpretações do cinema comercial. Não é um filme de soluções fáceis. O
diretor não cede e o que surgem na tela é um tratado da falta de ética natural
do novo século. Aqui, nem o Alcorão salva. Teresinha de Maomé e os três
cavalheiros vão continuar ao chão.
A originalidade do longa de
Asghar Farhadi está no lugar comum do cinema da terra dos aiatolás: a
simplicidade. O roteiro traz enredo de carne e osso, contemporâneo
e universal. A câmera mostra uma mulher da periferia grávida e casada com
um desempregado inadimplente trabalhando em um lar classe média que começa a se
desfazer após a esposa intelectual burguesa sair da casa onde vivem a
filha adolescente, o marido tenso e o sogro com mal de Alzheimer. Lendo
assim é desanimador.
Vendo... O domínio que
Farhadi tem do idioma cinema lhe permite conduzir e cruzar os dramas de cada
personagem e tecer um painel impar e de fácil identificação. As ações e a
lógica da elite e dos serviçais poderiam estar na carioca Laranjeiras, na
paulistana Vila Madalena ou no sul de Manhattan. E o acidente ou crime
que move “A Separação” – o aborto da empregada provocada por uma queda – é quase
um pão no nosso dia a dia. Vide o caso Thor: o jovem milionário estava em alta
velocidade ou a vítima imprudente cruzou a via?
As duas famílias
(iranianas) são tão reais e tão próximas de nós porque falam a língua da
contradição humana. Não há espaço para o bem versus o mal. Nem no ambiente
externo e nem na consciência. Os atores dessa sutil tragédia mostram que o bom
e o ruim são a cara da mesma moeda. As exceções são a filha da empregada, uma
criança, e o idoso infantilizado. Este é o anjo exterminador inocente que vai
empurrando os personagens lentamente para o xeque.
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